Em tempos de pandemia, Embrapa inova na comunicação remota com o agricultor familiar


 O distanciamento social provocado pela pandemia da covid-19 fez com que o teletrabalho fosse adotado por inúmeras instituições. A Embrapa é uma das que adotaram o isolamento social dos trabalhadores como medida para garantir a saúde de seus colaboradores. A decisão da Embrapa, além de garantir a segurança dos empregados, também reforça a importância de seguir as normas editadas pelas diversas esferas governamentais e as recomendações da Organização Mundial de Saúde (OMS), a fim de conter o coronavírus.

Desde março de 2020, as pesquisas e ações de transferência de tecnologia desenvolvidas com agricultores em agroecossistemas de base familiar tiveram que passar por uma ressignificação após a suspensão das viagens a campo.

Com metas do projeto Rede de inovação em produção, beneficiamento e comercialização de derivados lácteos caprinos dos Cariris Ocidental e Oriental da Paraíba, Sertão do Pajeú e Moxotó e Agreste Central e Meridional de Pernambuco (InovaCapri), a cumprir junto às famílias agricultoras da caprinocultura leiteira no Nordeste, nesses territórios, a equipe integrante responsável pela avaliação do solo, água, resíduos e vegetação de Caatinga, do projeto teve que superar algumas limitações e viabilizar as atividades de pesquisa e desenvolvimento exercidas com as famílias, em seus agroecossistemas, de forma remota, utilizando redes sociais e diferentes plataformas de videochamadas on-line e telefone.

O projeto InovaCapri, liderado pela pesquisadora Nivea Felisberto, da Embrapa Caprinos e Ovinos (Sobral, CE), integra o Programa de Apoio à Inovação Social e ao Desenvolvimento Territorial Sustentável (InovaSocial) da Embrapa e tem como objetivo fortalecer a rede de inovação em produção, beneficiamento e comercialização de derivados lácteos caprinos com identidade territorial de forma a impulsionar a inserção social e produtiva de agricultores familiares da Paraíba e Pernambuco. Essa ação do projeto vem sendo executada de forma integrada com atividades de outros projetos de unidades da Embrapa, como a Embrapa Solos UEP Recife e Embrapa Semiárido (Petrolina, PE), além da Universidade Estadual da Paraíba (UEPB) e Universidade Federal Rural de Pernambuco (UFRPE).

Atividades de campo realizadas por meio de viagens remotas

Os diversos cenários estabelecidos devido à pandemia do covid-19 estimularam a equipe ambiental do InovaCapri a adaptar as atividades de pesquisa, desenvolvimento e inovação no campo, por meio de trabalho remoto. O maior desafio foi combinar o uso de ferramentas de gestão da pesquisa participativa de campo com tecnologias midiáticas até então vistas como paradigmas, para este fim, dentro da conjuntura atual da Embrapa e nunca pensada pelo agricultor familiar.

O “campo remoto”, como foi denominada pelo grupo, essa modalidade de comunicação entre pesquisadores, agentes de desenvolvimento e agricultores familiares, tem permitido o exercício da pesquisa com os diferentes atores, reforçado a rede sociotécnica estabelecida em tempos presenciais e firmado a continuidade de uma rede colaborativa para discussão e construção de estratégias do bem viver em cada agroecossistema visitado. Alinhada aos objetivos do projeto InovaCapri, a adaptação desta metodologia participativa, em meio remoto, está sendo desenvolvida também no âmbitos dos projetos Metodologias Participativas para Potencializar a Agroecologia como Estratégia de Convivência com a Seca (Participa), coordenado pela pesquisadora Alineaurea Silva da Embrapa Semiárido, e do Zoneamento de Áreas Potencias à Barragens Subterrâneas no Semiárido de Alagoas (ZonBarragem), liderado pela pesquisadora Maria Sonia, da Embrapa Solos UEP Recife. Essa integração de ações constitui estratégia de fortalecimento mútuo que permite a otimização de recursos financeiros e expertises que estão organizadas nas equipes.

Para Manoel Batista de Oliveira Neto, pesquisador da Embrapa Solos UEP Recife, “as viagens de campo em formato remoto estão permitindo uma reaproximação por meio de diálogos com as famílias, em tempos em que a presença física pode colocar em risco a vida de todos”. As campanhas presenciais foram transformadas em visitas de campo remotas para viabilizar rodas de conversas entre agricultoras, agricultores e técnicos locais, visando, por exemplo, à discussão e devolução de resultados de análise de solo e água, aproveitamento de resíduos e o manejo da Caatinga. Neste primeiro ciclo virtual foram visitadas nove famílias e novas iniciativas já estão programadas.

Com o “campo remoto” pôde-se dialogar com os agricultores a partir dos mais diferentes locais, compartilhando sua visualização em tempo real. Essa ferramenta permite a interação durante a execução da atividade, bem como facilita a reaproximação entre o técnico e a família. De acordo com a pesquisadora Alineaurea Florentino da Silva da Embrapa Semiárido, “estamos realizando as interações instantâneas necessárias, antes, durante e após a atividade virtual, para executar o trabalho remoto com qualidade”. O agricultor Renato da Silva Brito do Sítio Macambira, em São João do Cariri, PB, também reforçou a importância da ação, “mesmo com a oscilação da internet aqui, valeu a pena estar com vocês, foi um encontro muito proveitoso, valeu muito a pena, espero que aconteçam outros para podermos partilhar mais conhecimentos.”

Potencialidade do trabalho remoto em agroecossistemas de base familiar

O “campo remoto” realizado virtualmente durante o período e 08 a 12 de março de 2021, aconteceu em dois estados: Paraíba e Pernambuco, percorrendo virtualmente o que seriam mais de 2.000 km de distância por terra. O “campo remoto” mostrou um caminho para o enfrentamento do distanciamento social, adaptando a rotina de trabalho remoto às atividades de campo nas comunidades rurais, diminuindo situações de contato humano presencial, sem deixar de acompanhar e desenvolver as pesquisas nas propriedades. Dona Cida, agricultora do Sítio Barrinhos, em Poção, PE, ficou muito feliz com o retorno da equipe de pesquisa ambiental ao sítio, para continuar as experiências que foram interrompidas em 2020. “Eu e minha família estamos felizes com vocês de novo aqui em casa, mesmo que pelo celular e ainda mais nos orientando e falando sobre os resultados dos exames de solo e água daqui do Sítio”. Com ou sem pandemia os agroecossistemas precisam gerar alimentos para seu sustento, de seus animais e, ao mesmo tempo, gerar alimentos para a população.

Para Nivea Felisberto, pesquisadora da Embrapa Caprinos e Ovinos, a comunicação “olho no olho” é insubstituível e contribui para a geração de vínculos em torno do campo. Entretanto, os tempos que estamos vivendo requerem criatividade para diversificar os métodos de interação, execução das atividades em campo e a manutençao e valorização da solidariedade e cidadania das famílias e da equipe.

“Compreender e legitimar as diferentes formas de se fazer presente nas comunidades rurais, ainda que remotas, tem provocado transformações nas relações que permeiam a agricultura familiar. Além disso, é uma forma de se compartilhar medos, angústias e mitos que envolvem a doença e podem ocasionar descompensação emocional. Porém, em tempo algum, nos iludamos que o virtual substitui o presencial. O estabelecimento de confiança a partir do contato presencial é indispensável para facilitar o sucesso do trabalho remoto. O remoto chegou para nos ajudar em tempos de pandemia, para somar ao presencial, jamais substituir”, ressalta o professor Simão Lindoso de Souza, da UEPB.

Dificuldades enfrentadas

A internet é de longe o grande vilão para a realização das nossas oficinas on line diretamente da zona rural. Porém o esforço, a criatividade e o querer dos agricultores têm superado e transformado as dificuldades. “Os agricultores estão se reinventado num esforço grande para superar as conexões de internet que ainda são muito precárias no meio rural. Sempre estamos tendo o retorno das nossas oficinas online, por parte dos produtores. Isso é muito valioso para construírmos juntos uma comunicação que atenda as limitações de todas e todos no uso da internet e também oportunizarmos a partilha de conhecimentos para o aumento da sustentabilidade dos agroecossistemas de nossos territórios”, enfatiza Francisco Éden, analista da Embrapa Caprinos e Ovinos.

Em todos os “campos remotos” realizados, foram utilizadas plataformas gratuitas de reuniões e redes sociais como o WhatsApp. As dificuldades existem, até porque tudo é ainda muito novo para todos. O processo participativo de construção desta metodologia que envolve várias ferramentas, está surgindo com força para superar os desafios do trabalho remoto com as familias nas comunidades rurais, e é ainda desafiador. Juntos, agricultores, técnicos, professores e pesquisadores, estão trabalhando para otimizar e validar cada vez mais essa metodologia. A nova forma de comunicação, mesmo com as dificuldades de ausência de conexão ou velocidade lenta da internet, tem provocado reações positivas nas famílias agricultoras. Elas estão enviando periodicamente vídeos, fotos, áudios e textos sobre o que ocorre nas suas propriedades, pelo grupo criado para a comunicação da equipe. Esse grupo do WhatsAapp é a caderneta de campo remoto do projeto, onde estão registradas todas as atividades desenvolvidas nos agroecossistemas, nesses tempos de pandemia

VITRINE DO CARIRI




FALA PARAÍBA-BORGES NETO

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